Porto de Sines

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quarta-feira, 17 de março de 2010

Primavera


Estamos sentados
E neflibatas bebemos coca-cola
nas públicas cadeiras da praça.

E
sobre as envenenadas acácias
andorinhas geometrizam o azul do céu
e despercebidos passarinhos africanos
cantam nos verdes braços vegetais
de um parque de cidade moçambicana
onde jovens discutem as pernas de Brigitte Bardot
e abúlicas mãos tamborilam
no tampo da mesa fúteis dedos.

Mas um grupo de estivadores
vem do cais vestindo
serapilheiras
e passa a três metros e meio
das cómodas cadeiras da praça
enquanto
cocacolizados
odes cantam nos ramos os bilo-bilana
e na surdina das tímidas meias-palavras
e subentendidos silêncios
ansiosos todos esperamos
indolentes as flores
da nossa comum Primavera.


[José Craveirinha]

12 comentários:

Vitor Chuva disse...

Olá Jorge!

Este poema tem o "cheiro" de uma viagem ao passado por terras Africanas, em tempo de tropa.
Tanto por lá como por cá se esperava, então, por uma Primavera que tardava em chegar ...

Um abraço
Vitor

Unknown disse...

Poema muito bonito.
Os sentimentos bailam com as andorinhas e os dedos nos tampos das mesas assim como os estivadores com as suas canções em surdina.

Jorge disse...

Viva Vitor!
A magia Africana está presente em todas as vivências de José Craveirinha. Ele também ansiava por essa eufemística Primavera.
Um abraço.

Jorge disse...

direitinho!
Grato pela sua sensível apreciação.
Craveirinha, o meu poeta africano preferido desde sempre, faz, no poema, vibrar as palavras num "lirismo indignado".
Um abraço.

Graça Pereira disse...

Meu Deus...que saudades! Das esplanadas onde se espantava o calor, das acácias vertendo sangue de tão vermelhas que eram, dos chiricos atrevidos poisando em todo o lado, da cocacola geladinha misturada com amendoins e tremoços, das garotas de mini saia que vocês olhavam cobiçosos e elas disfarçando o seu interesse..."ansiosos todos esperamos indolentes as flores da nossa comum Primavera".
Gosto da poesia de José Craveirinha mas...tenho a certeza que naquela esplanada se pensava noutras...primaveras!!
Beijo e obrigada.
Graça

Luna disse...

É engraçado ver , escutar o sentir das pessoas que já viveram ou estivem algum tempo em Africa, sempre fica aquele saudosismo.
beijos

Osvaldo disse...

Caro amigo Jorge;

Um belo poema com aromas de Moçambique...

Moçambique é provávelmente o país africano que mais gostaria de conhecer. Não sei de onde vem esta vontade férrea de um dia me encontrar a deambular por caminhos longínquos da nossa história, mas se um dia acontecer,... por minha vontade, o primeiro país africano será Moçambique.

Um abraço amigo.
Osvaldo

Jorge disse...

Graça,
Dentro dos jardins da Praça 7 de Março, em LM, existia a esplanada da foto, que muito apreciávamos nas pausas de trabalho ou encontros de fim de tarde. A foto e o poema de Craveirinha coincidem (princípio dos anos 70 do século passado).
Bj amigo.

Unknown disse...

Jorge

Chego aqui porque vi o teu cumentário, com o, no Menos Mau e gostei.

Agora também passei a gostar deste teu blogue. A que apetece voltar, o que farei, logo que possível. Conheço pessoalmente o Craveirinha, jornalista como eu. Grande Poeta, de quem sou, afortunadamente, Amigo. A transcrição deixa-me muito feliz.

Regressei há dias de uma viagem de 50 inolvidáveis dias por Goa (terra de minha mulher Raquel) e outras Índias. Quiz lá ficar, pois os goeses dizem que eu sou mais goês do que eles. Concordo.

Estou a publicar n'A Minha Travessa apontamentos da viagem. Muito gostarei de ver pelo meu blogue e se o quiseres, deixar uns cumentários, com o...

Abs

Jorge disse...

Multiolhares,
É a magia Africana que, por vezes, desperta um bichinho adormecido cá dentro.
Bjis.

Jorge disse...

Amigo Osvaldo,
Seja bem-vindo!
Grato pela sua confidência de visitar um dia Moçambique. Felicito-o por esse seu objectivo. Daqui faço força para que se concretize. Poderá assim usufruir dos seus aromas e contactos com gente maravilhosa.
Agradeço e retribuo o seu abraço.

Jorge disse...

Henrique,
Grato pela sua visita a este farol, cujo único intuito é ajudar os amigos, com um pouco da sua luz, a desviarem-se dos escolhos que, na caminhada da vida, se lhes deparem.
Conhecer José Craveirinha é uma honra, ser seu amigo é um privilégio.
Não conheço Goa, onde temos muitas raízes culturais e identitárias.
Goa já veio, entretanto, até mim numa pequena incursão que fiz em "A Minha Travessa", onde com muito gosto opinarei e... aprenderei.
Abraço.